domingo, 14 de julho de 2013

Chuva II

Era uma terça-feira. Antony, ou melhor Tony, como gostava de ser chamado as odiava. Sempre o dia mais parado da semana. Os crimes do final de semana já foram solucionados, os da quarta-feira de esportes na TV ainda seriam cometidos. Deu uma última tragada no cigarro o jogando o restante - menos da metade - pela janela três andares abaixo. Brandiu algum xingamento por seu escritório estar tão próximo do chão. Os fios de eletricidade, os caminhões que passavam pela rua tapavam sua visão. Seu telefone tocou, não, não era o telefone, era interfone. "Fala" apertou o botão já desgastado pelos anos de uso interpelando sua secretária, do outro lado da parede. O comissário de policia veio ao seu encontro. Enquanto ele entrava com um charuto fedorento entre os dedos. Por um segundo Tony pensou se havia pago aquelas multas todas... até onde se lembrava, não tinha. Sem a menor cerimonia o comissário se sentou reclamando das cadeiras. Vou ser direto Tony, brandiu ele com uma coluna de fumaça saindo junto da voz, Jack está vivo e fugiu do hospital. Jack.

O famoso assassino que levou um tiro de calibre doze no corredor de seu apartamento naquele dia de chuva. Tony sabia quem havia atirado nele. Sabia porque havia sido ele. Jack sempre foi muito esperto em esconder seus traços, seus assassinatos eram brutais. O comissário sabia que era ele na maioria dos casos, mas nunca havia nenhuma prova. Um único detetive particular, Tony, havia descoberto o rastro e, quando estava próximo de solucionar o caso, Jack matou sua esposa. O golpe foi baixo demais. Agora era pessoal, esse foi o motivo principal que levou Tony ao apartamento de Jack aquele dia. Que fez Tony descarregar os dois canos da espingarda calibre doze no peito de Jack. Por achar ter feito tudo certo saiu. Mas, pelo visto não. Puxou outro cigarro do maço e o acendeu quase sem fazer movimentos desncessários. O comissário sabia que havia sido Tony a ter feito o disparo, por isso não soltou a noticia para a imprensa. Não tinha provas, mas sabia que era pessoal.

Então, continuou o comissário batendo a cinza no cinzeiro já cheio, o quê vai fazer? O quê acha? Vou terminar o que comecei, respondeu Tony esmagando o restante do cigarro no cinzeiro. Tinha de parar com isso. O cigarro o mataria antes de Jack. Tony abriu a gaveta e de lá saiu uma pistola nome milimetros. Ele checou o pente se estava carregado. Estava. Engatilhou a arma e colocou às costas cobrindo com a blusa. Tem um problema, aquele homem corpulento, sentado à frente da mesa continuou, ele está fugindo com uma garota, filha do prefeito, não que eu goste do prefeito, mas... Tony entendeu a indireta. Não ligava. Mataria quem quer que fosse para lavar sua honra. Sabia que isso não adiantaria merda nenhuma, mas não ligava. Queria mais era vingança, vendetta. Quando pensou na moça pensou de mata-la primeiro, de modo a fazer Jack sentir o golpe. Mas ele era frio o suficiente pra pegar essa hesitação de Tony e acabar com ele.

Mais algumas frases foram ditas, a policia sabia onde Jack estava indo. Eles dariam algumas horas de vantagem para Tony. O comissário sabia como era isso de vendetta, afinal ele também tinha descendência italiana, sabia como a máfia agia e respeitava esse tipo de coisa, mesmo achando errado. Dito o que tinha de dizer ambos saíram. Na rua cada qual entrou em seu carro. Tony ia naquele velho Mustang Fastback dos anos 60, azul escuro que havia achado por uma pechincha. O comissário em seu taurus, um carro de policia descaracterizado, mas que trazia no porta-luvas o giroflex vermelho, semelhante àqueles de seriados americanos dos anos oitenta. Com o endereço em mãos Tony seguiu pelas ruas certo de seu plano. E depois? Depois não importa. O quê importa é o agora. Na frente da velha fundição havia um carro, uma Chevy Suburan. Pela cor - verde escuro - ele deduziu ser da moça que estava com Jack. Tirou a pistola da cintura. Checou as balas uma última vez. Puxou o para-sol, a foto de sua mulher sorrindo lhe abençou. Tinha mais fé nas pessoas que nos santos, até mesmo mais fé que em Deus, isso se, claro, ele existisse mesmo. Se benzeu e saiu do carro.

Ao entrar no prédio sentiu o ar pesado. Sabia que aquele seria o último de seus casos, depois pretendia se aposentar e, quem sabe, escrever um livro com suas investigações. Quem sabe pudesse, assim, ter alguma paz dentro de si. Estava ficando velho, beirava os cinquenta anos já, não convinha esse tipo de ação para alguem tão velho. Caso ainda estivesse na policia certamente já estaria em funções administrativas, preso à uma mesa de escritório esperando a data da aposentadoria chegar. Avistou Jack. Jack avistou Tony. Um apontou a arma para o outro. Trocaram nem meia duzia de palavras. Tony atirou ao fim de suas palavras. O disparo de jack saiu torto, os meses no hospital o fizeram perder a precisão no tiro. Vendetta cumprida. Logo após o quê se ouviu foi outro tiro. Michele, a filha do prefeito, amante de Jack, disparando em Tony. Porém o tiro de Jack havia ricocheteado e achado alguns tonéis de combustivel. Agora a velha fábrica ganhava luzes produzidas pelas chamas que tomavam o lugar. A vingança de Tony foi cumprida. O sonho de Jack de ter sua vingança também. A Michele coube apenas fugir do incendio. Quando a policia chegou ela disse que os dois lutaram bravamente e um atirou no outro. Ela, filha de um siciliano, neta de um mafioso conhecido, tinha garantido a honra dos dois, e da dela. Honra lavada com sangue é honra mantida. O quê ambos nunca souberam era sua origem: ambos de famílias opostas, ambas da pequena ilha ao sul da Itália. Ambos mantendo a tradição que nunca nem ao menos souberam existir. E ambos mantendo a balança em equlibrio.

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